O novo paradigma para a gestão de recursos hídricos

Por: Frederico Lopes

Há cerca de duas décadas, os níveis de atendimento e eficiência dos sistemas de abastecimento de água e tratamento de águas residuais em Portugal eram muito baixos. Entretanto, Portugal infraestruturou-se de forma eficaz e este processo conhecido como “O Milagre Português” contribuiu substancialmente para a melhoria das condições de saúde pública e ambientais para todo o país.

A inovação é hoje um dos desafios centrais do Quadro Estratégico de Compromisso do Grupo Águas de Portugal (AdP), e no qual se posiciona como um dos mais eficientes e sustentáveis operadores internacionais na gestão da água, focado na excelência do serviço ao cliente, na inovação, na resiliência, na neutralidade carbónica e na economia circular. Esta estratégia, reforça ainda mais a inovação, em rede, já hoje feita pelas empresas do Grupo AdP.  Os grandes investimentos estão executados e as empresas focam-se agora na manutenção e gestão dos ativos, na melhoria da eficiência da operação e na inovação por forma a caminhar para novas soluções, mais inteligentes e mais “verdes”.

No entanto o setor da água é ainda frequentemente descrito como conservador, avesso ao risco e lento a mudar. A abordagem que vínhamos a ter de um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo está ultrapassada, como vieram comprovar os acontecimentos dos últimos meses. Estamos assim, numa nova era, que mais do que complexa tende a aproximar-se ao caos. Veja-se a atual pandemia, saúde pública, guerra, política e eco­no­mia internacional, para não falar das alterações climáticas, que nos tocam mais diretamente. É este o novo mundo, é esta a “nova normalidade”.

O consumo crescente de água para diferentes finalidades, como sejam o abastecimento público, a agricultura e a indústria, entre outros, tem vindo a impor uma pressão cada vez maior sobre os recursos hídricos. Este tema da água é, sem dúvida, um dos problemas mais sérios e sensíveis que iremos defrontar nos próximos anos, e à medida que os desafios se intensificam, as abordagens convencionais sobre a água são cada vez menos sustentáveis.

Para alcançar a segurança hídrica, o setor da água transita para uma indústria mais sustentável e resiliente. A adoção de tecnologias emergentes acelerará esta atividade, no sentido de se tornar mais circular. A expectativa sobre estas tendências é que elas possam ser usadas em diferentes contextos, criando novas formas de executar as suas atividades. Graças à tecnologia, os sistemas centralizados, plenos de recursos para reutilizar e reintegrar, serão complementados por sistemas descentralizados, que poderão estender-se até às nossas casas.

Normalmente, a inovação da tecnologia da água é linear, lenta, evolutiva e não revolucionária. Mas estas novas tecnologias são inovações disruptivas, que não se limitam a ser evolutivas, e podem transformar a forma como é hoje feita a gestão da água. Basta observar como as tecnologias influenciaram outros setores, como o setor da energia. A ascensão da energia solar nas nossas habitações são um exemplo que ilustra bem o que pode acontecer com a água.

Os materiais avançados e as tecnologias digitais como por exemplo a internet das coisas e das pessoas, o big data, a inteligência artificial, a robótica e a realidade aumentada e virtual, também acelerarão outras áreas do ciclo da água. Estas permitem não só a monitorização em tempo real da qualidade e da quantidade da água, do desempenho dos ativos, como até podem criar modelos preditivos, e assim ajudar a melhorar a sustentabilidade dos recursos hídricos, a resiliência das infraestruturas, e reduzir as emissões de carbono. A sociedade do futuro insere-se num espaço físico combinado com o ciberespaço, utilizando tecnologias de ponta, e onde pessoas estão mais libertas dos inúmeros constrangimentos a que hoje estão sujeitos e mais preparadas para serem mais humanas, inteligentes, conectadas, eficientes e sustentáveis.

A transição digital que está em curso, origina uma enorme quantidade de dados, e estes tornaram-se num dos principais ativos para as organizações. O processo de “datificação” e a adoção de dados abertos, pode resultar em novas formas de prestação de serviços criativos e inovadores. Mas, para isso, é necessário quebrar os “silos de informação”, eliminado as restrições de acesso aos dados, combinando os princípios da transparência, participação e colaboração, assim como o potencial de desenvolvimento económico que o digital trouxe. A enorme quantidade de dados que é gerada congrega em si um enorme potencial de utilização e de desenvolvimentos que podem ser úteis e importantes, tanto para as organizações públicas como para a sociedade civil e o mundo empresarial. O grande desafio passa por facilitar o seu acesso seguro, beneficiando vários grupos e sectores da sociedade. Ao democratizar a informação, colocando os dados acessíveis nas mãos de todas as partes interessadas, começamos a esclarecer melhor, abrimos o potencial para acelerar a adoção de tecnologia e estimulamos a inovação em modelos de negócios, financiamento e políticas públicas.

Vivemos um tempo, em que as empresas alinham a sua estratégia com a evolução do contexto e em que a tecnologia é um poderoso driver de inovação. Não podemos limitarmo-nos a introduzir melhorias incrementais nos serviços e produtos já estabelecidos, entregando valor aos mercados e clientes habituais. O paradigma mudou, é necessário romper com algumas soluções do passado, acrescentar valor diferente daquele que estamos habituados, sem temer mudar a forma como habitualmente fazemos. Diante da eminente necessidade de evoluir, o tradicionalismo deve render-se à inovação. Uma estratégia a prazo, disruptiva, tolerante ao erro, que não se limite a gerar valor, mas sim a criar um novo valor de economia circular, poderá mudar e melhorar, a nossa forma de lidar com o abastecimento público e saneamento, bem como a relação destes com a gestão dos recursos hídricos.

Fonte: Visão Sapo.

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